Modinha: Análise da Obra de Beatriz Milhazes
Modinha não é apenas o título de uma das obras mais cativantes da aclamada artista brasileira Beatriz Milhazes; ela é, de fato, uma porta de entrada para um universo de cores, formas e referências culturais. Milhazes pintou esta tela em 2007, e ela se tornou um excelente exemplo do estilo singular que catapultou a artista para o estrelato internacional, pois combina o rigor da abstração com a alegria tropical de seu país de origem.
O Significado Cultural por Trás do Título Modinha
Primeiramente, o título Modinha faz uma referência direta a um gênero musical popular brasileiro dos séculos XVIII e XIX. Este gênero é caracterizado por canções líricas, sentimentais e melancólicas, que, geralmente, acompanham um violão.
Apesar disso, essa escolha de título é intrigante, pois a estética visual da obra é tudo menos melancólica: ela transborda vitalidade, ritmo e otimismo. Assim, essa aparente contradição sugere uma conexão sutil entre a musicalidade (o ritmo visual das formas) e a tradição cultural brasileira, onde a Modinha criou suas raízes. Por conseguinte, podemos ver a obra como uma composição, que harmoniza elementos complexos.
A Estética: Cores, Colagem e Relações Formais
Em segundo lugar, Modinha é visualmente impactante, pois Milhazes combina várias técnicas e influências.
A Festa das Cores e Formas
Uma explosão de cores primárias e secundárias domina a obra, incluindo amarelos solares, laranjas vibrantes, azuis profundos e vermelhos apaixonados. Os círculos concêntricos e sobrepostos de diversos tamanhos são o elemento formal mais proeminente.
Como resultado, esses círculos criam uma sensação de profundidade e movimento, como se pulsassem ou dançassem sobre o plano. Além disso, os padrões internos dos círculos e as formas orgânicas que os interceptam lembram rendas, florais, arabescos barrocos e até mesmo elementos de Carnaval.
A Técnica da Monotipia e Colagem em Modinha
Afinal, Milhazes é famosa por sua técnica única, que se assemelha à decalcomania ou monotipia.
Para começar, a artista pinta as formas e padrões em folhas plásticas transparentes separadas.
Posteriormente, após secarem, Milhazes transfere essas "membranas" para a tela em um processo meticuloso, semelhante ao de uma tatuagem.
Finalmente, o resultado é uma superfície de pintura que possui uma textura lisa, quase de plástico, mas com a opacidade e imperfeição da transferência manual.
Em outras palavras, essa técnica confere à Modinha uma aparência de colagem sofisticada, onde as camadas de cor e forma parecem flutuar sobre o fundo. De fato, a justaposição de elementos geométricos (círculos) e orgânicos (arabescos) cria uma tensão dinâmica central na obra da artista.
O Diálogo Entre o Local e o Global
Adicionalmente, a análise de Modinha não estaria completa sem reconhecermos o diálogo que Beatriz Milhazes estabelece entre a cultura visual brasileira e as tendências da arte moderna ocidental.
Referência Brasileira: A paleta de cores e os motivos florais remetem à arquitetura colonial brasileira, ao design popular, aos tecidos e à exuberância da natureza tropical. Em suma, a obra celebra a visualidade do Rio de Janeiro de forma abstrata.
Referência Global: A ênfase na geometria e na abstração faz um aceno ao Modernismo e a artistas como Henri Matisse (uso da cor e do recorte) e ao Op Art (os padrões concêntricos).
Em última análise, Modinha é uma celebração da superfície — uma tela que nega a profundidade tridimensional em favor de uma experiência visual rítmica e caleidoscópica. Portanto, é uma Modinha visual, uma canção de cores que ressoa com a alma vibrante do Brasil.